(Re)ler o passado / (re)escrever o futuro: literatura digital e património imaterial
Diogo Marques
UNIVERSIDADE DE COIMBRA, CLP
orcid: 0000-0002-5374-3364
Ana Gago
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA, CITAR
orcid: 0000-0002-8530-5887
O que lemos constitui o passado;
o que escrevemos representa o futuro.
Mas podemos escrever apenas com o que lemos
e só pela escrita podemos ler.
Robert ScholesRealmente pode dizer-se que, desde sempre,
se para uns a tradição existe e deve ser imitada,
para outros, se existe é para ser reinventada.
Ana Hatherly
I. Na saudade da pedra o granito da história
Em Literatura Cibernética 1: autopoemas gerados por computador (1977), livro pioneiro em Portugal na área da criação literária assistida por computador, da autoria de Pedro Barbosa [1] podemos encontrar o seguinte conjunto de “trovas eletrónicas”:
Na saudade da pedra o granito da história.
Na saudade da pedra a história do granito.
Na saudade do granito a pedra da história.
Na pedra a saudade da história do granito.
Na pedra do granito a história da saudade.
Existindo em potência, dada a natureza virtual das suas iterações, as trovas que compõem o poema Porto são (re)combinações sucessivas de quatro vocábulos ou variáveis: “pedra”, “granito”, “história” e “saudade”. Mais do que uma homenagem à cidade natal de Barbosa, Porto poderá constituir-se enquanto exercício metarreflexivo sobre a memória, assente na relação simbiótica entre os sítios e as vivências, entre a pedra e o valor simbólico, afetivo e memorial que lhe dá forma; esse granito de que são feitas a história e a saudade.
Apresentando uma forte tensão dialética entre tradição e inovação, na associação entre (uma) tradição literária, a trovadoresca, e (um) meio tecnológico, o eletrónico, poemas ciberliterários como Trovas Electrónicas justificam a herança do Experimentalismo (português), por exemplo, na natureza da Ciberliteratura enquanto área de investigação científica e artística [2]. Adicionalmente, na prática ciberliterária de Pedro Barbosa, do processo experimental fazem parte não só um valor estético como um valor experiência, “tanto para o autor do texto como para o seu destinatário” (Hatherly, 1995: 10), à semelhança da combinação que Ana Hatherly atribuíra ao programa da PO.EX com base nas seguintes “tendências”: “(1) a que se desenvolve a partir do ressurgimento de certos valores estruturais da poesia barroca, tendência que ocorre nos anos 50 e prossegue até hoje; (2) a que se insere no Movimento da Poesia Concreta que surge no Brasil e na Europa nos anos 50, floresce em todo o mundo na década de 60 e 70 e persiste ainda no presente.” (1995: 187)
Referindo-nos ao campo de estudos do Património, podemos encontrar, de novo, a mesma tensão dialética em que se medem e pesam afeto e memória, pedra e saudade, valor de uso e valor afetivo, materialidade e imaterialidade. A Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial da UNESCO (2003) apontou vários caminhos possíveis para o reconhecimento do valor patrimonial de uma certa tipologia de expressões e manifestações da atividade humana, até então excluídas da anterior lógica de classificação, abrangendo essencialmente uma tipologia de património material: objetos, edifícios, sítios. Num movimento de (dis)tensão, considerando-se a origem etimológica da palavra tensão, como tensionis, tensio, tendo, ou ato de esticar, a Convenção enuncia uma (re)nova(da) definição de património cultural imaterial, que compreende “práticas, representações, expressões, conhecimentos, competências”, bem como os “instrumentos, objetos, artefactos e espaços culturais que lhes estão associados” (UNESCO, 2003: 3), de forma indissociável. Apresenta-nos, pois, soluções para o registo, estudo e salvaguarda de diversas tipologias de “património cultural imaterial”, como sendo as técnicas artesanais tradicionais, mas também as “tradições e expressões orais”, as artes do espetáculo, as “práticas sociais, rituais e atos festivos” ou “os usos e conhecimentos relacionados com a natureza e o universo” (4). Porém, e talvez mais importante no contexto do presente artigo, o valor artístico dos objetos e artefactos mencionados não é considerado por si, mas em relação ao valor de uso ou performativo dos mesmos. O que, de certa forma, parece apresentar uma compatibilidade algo insuspeitada com o carácter processual do objeto experimental.
De modo similar, também a Língua é entendida como veículo ou “vetor do património”, estando a literatura excluída, pelo menos de forma direta, do conjunto de tipologias de “património cultural imaterial” propostas na Convenção [3]. Por outro lado, no Artigo 13.º da Convenção, relativo a “Outras medidas de salvaguarda”, é sugerida a realização de estudos artísticos, como parte de metodologias de investigação que garantam uma eficaz salvaguarda do património, em particular daquele que se encontra em maior perigo (UNESCO, 2003: 7), como sendo o património das populações indígenas e/ou minorias étnicas, nomeadamente num cenário de guerra ou conflito, mas também, de um modo geral, as tradições populares de base oral.
Tendo em conta o supramencionado, encontramos nas práticas ciberliterárias, neste caso de base combinatória e gerativa, diversos aspetos de continuidade renovada em relação às narrativas populares de base oral, no que diz respeito à sua natureza orgânica, auto-(re)criativa e muitas vezes surreal (no sentido de algo que causa estranheza e que se encontra para além do real). Além disso, na junção entre dois elementos aparentemente opostos, como um objeto funcional, o computador, e a tradição de contar estórias, potenciam-se fenómenos de (re)valorização sígnica e significativa. Sendo o texto (virtual) imaterial, reúne em potência toda a “pluralidade de realizações textuais por materializar signicamente” (Barbosa, 1996: 9). A afirmação do espaço do potencial cria alterações ao “circuito comunicacional da leitura” e abre caminho para novas funções do texto, incluindo a didática, ao possibilitar processos de leitura interativos e processos de coautoria, “envolvendo a participação do leitor na cocriação do texto final mediante um processo simultâneo de escrita-leitura” (10). Dito de outro modo, se é certo que a análise de Literatura Digital em Língua Portuguesa serve enquanto objeto de valorização patrimonial per se, não é menos certo que poderá igualmente servir enquanto ferramenta didática e fator de inovação na relação com o seu próprio património imaterial, o da oralidade.
Num momento em que se discute o estado do Ensino da Literatura Digital em Portugal, sendo, nesse contexto, particularmente significativa a realização do I Colóquio Internacional: Ensino da Literatura Digital (FLUC, Coimbra, 25 e 26 de julho de 2019) [4], reforça-se a premência da reflexão sobre as potencialidades da aplicação de processos de escrileitura, não só para o ensino da língua e literatura portuguesa, como também para o reconhecimento da sua dimensão patrimonial (imaterial). Nesse sentido, os exemplos que se seguem revelam, também, o potencial disruptivo das artes, e da literatura digital, em particular, para (re)criar as narrativas populares de base oral, conferindo-lhe leituras atuais (e atualizadas), novos valores de uso e de memória e novas possibilidades de (re)transmissão.
II. A Ciberliteratura portuguesa
Cunhado, nos anos 1990 [5] por Pedro Barbosa, o termo “ciberliteratura” foi utilizado no livro homónimo (1996b) enquanto reflexão sobre as próprias experiências de criação literária assistida por computador. Uma das séries mais representativas do trabalho desenvolvido pelo autor é o conjunto, já referido, de “auto-poemas gerados por computador”, criados originalmente entre 1976 e 1977, com o apoio do Eng.º Azevedo Machado, no Laboratório de Cálculo Automático (LACA) [6] da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Organizados em duas tipologias, permutativos ou combinatórios e aleatórios, os textos foram desenvolvidos com recurso a uma perfuradora de fita, tendo sido publicada uma seleção dos mesmos no primeiro volume, A Literatura Cibernética 1: autopoemas gerados por computador (1977), de uma trilogia que se completa com Literatura Cibernética II: Um Sintetizador de Narrativas (1980) e Máquinas Pensantes: Aforismos gerados por computador (1988). No caso dos “poemas permutacionais”, trata-se de recombinações e de disrupções, através da introdução de novos vocábulos, da primeira, segunda e terceira estrofes do Canto I de Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões, e do poema Exercício espiritual de Mário Cesariny, retirado de Manual de Prestidigitação (1956). Já os poemas aleatórios – muitos dos quais, curiosamente, denominados de trovas ou lengalengas – reúnem sequências de (re)combinações de frases, ou versos, a partir de uma só frase inicial. Para além de reprogramado e reeditado pelo autor, em 1996 [7], o “motor textual” conceptualizado por Pedro Barbosa foi, em 2014, e numa segunda tentativa de contornar a inevitável obsolescência tecnológica, adaptado para Javascript, por Rui Torres, usando o código-fonte de Nuno M. Ferreira, e expandindo, por fim, o trabalho pioneiro de Pedro Barbosa a um merecido, embora tardio, reconhecimento internacional (publicação na terceira antologia de Literatura Digital da Electronic Literature Organization) [8].
Fazendo aqui jus à origem etimológica da palavra trova, torquere, seria, aliás, Rui Torres, num novo movimento de torção, ou de rotação, a dar continuidade ao trabalho desenvolvido por Pedro Barbosa, mais concretamente no Centro de Estudos de Texto Informático e Ciberliteratura (CETIC), da Universidade Fernando Pessoa, no Porto, tanto ao nível da criação como da investigação no campo da literatura digital em Língua Portuguesa [9]. A título de exemplo, Cantiga [10], de 2012, é um “motor textual com diálogo entre cantigas medievais (a poesia do trovadorismo) e a releitura que delas foi feita por Salette Tavares”, com a particularidade de utilizar, como imagens de fundo, desenhos, inscrições e rubricas dos séculos XV e XVI do Cancioneiro da Ajuda, bem como léxico adaptado de cantigas medievais galaico-portuguesas [11].
Sendo inovadora na forma como atribui novos valores de uso, nomeadamente de uma função artística, ao objeto computador, a Ciberliteratura caracteriza-se ainda, entre múltiplos outros aspetos, pelo questionamento da autoria que o processo e resultado acarretam, assumindo-se a apropriação e a (re)criação como matéria e como objeto literário. Porém, tal como demonstrado por Maria dos Prazeres Gomes, na sua tese de doutoramento intitulada Outrora agora: relações dialógicas na poesia portuguesa de invenção (1993), em torno do conceito de plagiotropia, como aliás o próprio Rui Torres tem vindo a desenvolver no seu trabalho de investigação criativa, muitos dos aspetos postos em causa pelas práticas literárias digitais não constituem inovações exclusivas. Não só a ideia de apropriação foi amplamente explorada, por exemplo, pelos vários Experimentalismos, a partir da segunda metade do século XX, como a própria utilização experimental do computador para fins literários, entendendo-se este como um meio e não como um fim, encontra eco em práticas anteriores: “da plasticidade verbal de objetos não verbais a poemas-objeto e livros de artista; do uso da caligrafia e escrita manual a técnicas refinadas de poesia combinatória; e da fotocópia e eletrografia à vídeo-poesia” (Torres e Baldwin, 2014: XVII; tradução nossa).
Outras pontes poderão, aliás, ser estabelecidas entre diferentes momentos da produção (e tradição) literária portuguesa. Ana Hatherly, poeta experimental, entre múltiplas outras facetas, foi também responsável pelo estudo e divulgação de um conjunto considerável de textos visuais dos períodos Maneirista e Barroco, de autoria portuguesa. Na sua “investigação histórica” [12], revelou paralelismos entre as técnicas utilizadas e as dinâmicas de leitura proporcionadas por esses autores (com particular atenção para os labirintos de letras, charadas e enigmas) e as experiências levadas a cabo por autores portugueses de poesia concreta e visual, nas dimensões lúdica e participativa e no cariz intrinsecamente educativo [13].
O conceito de cibertexto, proposto, em 1997, por Espen Aarseth, define algumas das particularidades mecânicas identificadas por Ana Hatherly, concretamente nos textos em que o próprio meio é parte da obra, exigindo, de certa forma, a colocação do leitor numa posição “extranoemática”, i.e., necessitando da sua participação na produção semiótica do texto. Aarseth apelida de “ergódico” este fenómeno, apropriando-se do termo da Física com origem etimológica no grego e que associa “trabalho” ou “obra”, ergon, e “percurso” ou “via”, hodos, e relacionando-o, à semelhança de Hatherly, e também de Pedro Barbosa, com a capacidade maquinal do cibertexto para produzir e multiplicar estruturas verbais e, em última instância, “produzir variedade de expressão” (Aarseth, 1997: 21).
Não sendo a noção de cibertexto exclusivamente aplicável ao texto ciberliterário, poderemos encontrar pontos de diálogo e de continuidade na criação literária portuguesa, pelo menos desde o Barroco, com influência sobre a criação literária assistida por computador. Pedro Barbosa enquadra, aliás, a ciberliteratura no contexto mais alargado de uma “evolução artística”, a partir do conceito de “estética combinatória”, estética esta que poderá, segundo o mesmo, ser encontrada logo “na arte dos primitivos, mas também nos jogos infantis”, reencontrada “na poesia oriental e no maneirismo europeu do século XVIII” e redescoberta “nas mais recentes experiências da vanguarda poética e artística”, referindo-se às experiências levado a cabo pelo próprio e por autores precedentes no campo da poesia experimental (Barbosa, 1977: 33).
Não obstante, a utilização do computador, enquanto “telescópio de complexidade” (Barbosa, 1996b: 10), veio potenciar e acelerar a capacidade programática e operacional de aspetos estruturais combinatórios e/ou gerativos, já presentes, por exemplo, na matriz da poesia trovadoresca. Apropriando-se e subvertendo características estruturais e programáticas do texto poético, como sendo a rima e a métrica, acrescenta-lhes um potencial de variabilidade e aleatoriedade, numa dimensão temporal igualmente mais alargada. A este respeito, mais recentemente, e referindo-se uma vez mais à criação assistida por computador, Barbosa apontou aquilo que identifica como sendo “Aspectos Quânticos do Cibertexto”, alargando o entendimento de “campo textual” à sua unidade mínima, a palavra, e máxima, a sua geração e recombinação potencialmente infinitas (Barbosa, 2006).
Dando, como já vimos, continuidade a determinados pressupostos identificados no Experimentalismo português, a Ciberliteratura distingue-se pela possibilidade de inovar, dentro da tradição, utilizando o computador como agente recriado e agente de (re)criação. Nesse sentido, aproxima-se do objetivo “desmitificante”, anunciado por E. M. de Melo e Castro, para o programa e génese da Poesia Experimental Portuguesa. Sendo que, para Melo e Castro, o que distinguiria a Poesia Experimental Portuguesa seria, para além da “desmaterialização” e do seu forte cariz conceptual, a atitude “construtivista” e inerentemente progressista do experimentalismo, de base “cientivista” e “objectivista”. Apenas ao colocar-se numa posição de outsider, metarreflexiva, abordando a linguagem como matéria e como processo, em todas as suas dimensões espaciais, verbi-voco-visuais, e, contudo, não discursivas, a PO.EX conseguiria efetivamente concretizar a sua missão, como vanguarda: “dar um outro entendimento da tradição poética portuguesa” (Castro, 1981: 10).
III. Oralendas e outras que tais
Para além do potencial de inovação ao nível da criação literária, os processos de escrileitura de base gerativa e combinatória, presentes na Literatura Digital, abrem caminho para outras formas de texto e para outras funções, como a didática. No livro-disquete MS-DOS Teoria do Homem Sentado, Pedro Barbosa chega mesmo a falar de uma “Linha de Aplicação Didáctica: ao permitir a re-escrita de textos clássicos ou quaisquer outros textos pré-existentes, o programa renova-lhes intra-textualmente todo o seu inesgotável potencial de sentido” (Barbosa, 1996b: 19). São, contudo, várias as aplicações didáticas destes processos, para além do referido potencial para o ensino da língua e da literatura portuguesas. Uma outra terá a ver com a promoção da literacia digital tendo em conta, por exemplo, a noção de literacia processual, explorada por Noah-Wardrip Fruin (2010: 250-252), a partir da qual é dada ênfase às questões processuais, de mediação e significação, na escrita e leitura de algoritmos [14]. De acordo com Manuel Portela, e na medida em que esta noção poderá verificar-se útil para o ensino da língua e literatura portuguesas, entendendo-se linguagem como “máquina gerativa”, é possível traçar paralelismos entre o “nível semântico e sintático das linguagens de programação” com “as propriedades auto-replicativas, auto-referenciais e recursivas do código linguístico” (Portela, 2009: 47-48). Dito de outro modo, à função do computador enquanto “calculador de probabilidades”, acrescenta-se a componente de “amplificador de complexidade” (Barbosa, 1996b), ou de (re)criação literária. Esta, junta com a componente de programabilidade, permite, por exemplo, a que, na construção de uma base de dados para um poema combinatório, se obedeça, por necessidade programacional, a um processo de total desconstrução semântica e sintática.
Em Portugal, as recentes reformas ao nível da flexibilidade curricular, assim como a definição de Aprendizagens Essenciais, onde se inclui a literacia digital, e do Perfil de Alunos para a Escolaridade Obrigatória, referem a necessidade de caminhar para uma “uma literacia mais compreensiva e inclusiva”, prevendo o recurso a uma “pluralidade de géneros textuais, em contextos que o digital tem vindo a ampliar” (Ministério da Educação, 2018: 2). Assim, ainda que de forma pouco expressiva, as recomendações do Plano Nacional de Leitura para 2027 [15] incluem obras literárias digitais, algumas das quais especialmente vocacionadas para o ensino da língua e da literatura portuguesas, sendo esta uma tendência seguida, na atualidade, por alguns autores portugueses. Porém, independentemente da relevância que este passo institucional representa, a montante e a jusante, mantém-se, entre outros, o problema da obsolescência tecnológica (mais ou menos programada). E mesmo nos casos em que existe uma estrutura empresarial ou similar que sustente um projeto de criação literária, a dificuldade em dar-lhe continuidade por vários anos continua a manifestar-se. É o caso do “gerador de contos interactivo” promovido nos anos 90 pela empresa Diacoma. Embora a sua natureza fosse sobretudo hipertextual, e não propriamente combinatória, o programa merece referência por parte de Pedro Barbosa, em A Ciberliteratura, vendo, no gerador, potencial similar ao dos videojogos que seduzem “qualquer criança” – sendo que aqui o processo de sedução seria feito pelo “apelo à palavra que estes programas lhe propõem, mediante uma manipulação interactiva da história através do teclado da máquina.” [16] E acrescenta, afirmando que:
Este é, com efeito, um meio hábil de apelar para o espírito lúdico e criativo das crianças, tentando assim cativar, para a esfera da linguagem, um público jovem hoje tão arredio da literatura editada em livro. Trata-se de lutar no terreno com a concorrência alarmante que à literatura é movida pelos novos meios tecnológicos.(Barbosa, 1996b: 203)
Resultado de uma experiência bem mais recente, o projeto Murais e Literatura em desenvolvimento na Universidade de Coimbra, no âmbito do Programa de Doutoramento em Materialidades da Literatura [17], propõe-se criar três experiências interativas, a partir dos murais de Costa Pinheiro, presentes no jardim infantil do Instituto Maternal Bissaya Barreto, em Coimbra, correspondendo a três diferentes níveis de dificuldade, estabelecidos mediante a faixa etária e competências de aprendizagem do potencial utilizador. Com um objetivo assumidamente didático, vocacionado para o ensino do Português no 1.º ciclo e Ensino Básico, reflete igualmente uma preocupação com a dimensão patrimonial na criação literária portuguesa.
A primeira experiência tem como base as novelas de cavalaria, transformadas em novela de “passaria”, (re)misturando personagens tipo deste género com as figuras dos murais de Costa Pinheiro. Acrescenta-se ainda a possibilidade de alterar aspetos físicos das personagens, cores e inclusivamente o género e a função das mesmas. “Deste modo, poderá ser a Dama Si a salvar Dom Dó e a Dama do Lago, o Mago Laus e os cavaleiros negros mudam de género e trocam os mundos do bem e do mal que tradicionalmente habitam” (VV.AA., 2019: 17). A segunda experiência parte das oralengas – lengalengas e cantigas infantis portuguesas de tradição oral – como a cantiga Todos os patinhos sabem bem nadar, permitindo diferentes níveis de manipulação combinatória, adequados às idades e níveis de literacia dos utilizadores. Assim, com o avançar dos níveis, serão acrescentadas mais palavras ou variáveis combinatórias, aumentando-se o cariz gerativo do texto. De salientar que a este aspeto gerativo do texto é atribuído um valor autoral, permitindo aos utilizadores, em níveis mais avançados, que introduzam variáveis e registem a “sua” versão do texto gerado. A terceira experiência distingue-se das precedentes por tratar-se de uma obra literária original, um conto hipertextual, adequado para crianças entre os 9 e os 11 anos de idade: O relógio de Santa Bifana. A narrativa partilha da matriz surrealista e interativa das experiências anteriores, fazendo-se recurso a processos aleatórios na seleção das personagens e permitindo ao utilizador definir e transmutar a sua identidade, adereços e função.
Num outro exemplo e diferente abordagem, fora do contexto escolar ou educativo, Oráculo [18] é representativo das potencialidades inerentes à associação da criação literária em contexto digital, de base combinatória, para o estudo, valorização e (re)interpretação do património imaterial, neste caso, de uma lenda local: a lenda da Bruxa d’Arruda. A obra, com a autoria do coletivo wr3ad1ng d1g1t5 (Ana Gago, Diogo Marques e João Santa-Cruz) [19] foi desenvolvida no âmbito da 1.ª Edição do Prémio de Artes Visuais Bruxa d’Arruda, promovido pelo Município de Arruda dos Vinhos [20].
Figura 1. Exemplo de variações, em dois acessos, ou leituras, do Oráculo.
Figura 2. Exemplo de variações, em dois acessos, ou leituras, do Oráculo.
Partindo de um dos feitos mais conhecidos da Bruxa d’Arruda – a estória da cura da filha de um médico de Setúbal de um estranho mal da barriga – Oráculo proporciona uma experiência de leitura interativa, na medida em que, a cada leitura, a narrativa é alterada, através da introdução por recombinação de determinado vocabulário. Dentro das variáveis introduzidas encontram-se o nome da Bruxa, o local de origem do médico, os instrumentos e ingredientes utilizados na preparação da cura e o resultado, a purga e consequente cura da paciente [21].
No final da leitura, é possível recomeçar a história e, à semelhança do exemplo das oralengas, guardar um registo da versão da história gerada, através do envio da mesma para o e-mail indicado pelo utilizador. Com uma estética minimalista, ao nível gráfico e visual, focada na legibilidade do texto, Oráculo procura proporcionar um ambiente imersivo, através da inclusão de sons e animações simulando a movimentação da água e, deste modo, fazendo referência a umas das técnicas de adivinhação e de esconjuro atribuídas à Bruxa: a leitura do azeite sobre a água. Para além da versão apresentada na exposição coletiva que reuniu todas as obras a concurso [22], a obra encontra-se agora disponível online, mantendo-se a lógica de navegação, interação e de partilha de resultados da versão original.
Apesar do particular contexto local que a motivou, Oráculo não teve como pretensão fixar uma versão original da história da Bruxa d’Arruda, assumindo, pelo contrário, o cariz mutante e transmutador das lendas, como organismos vivos, em constante regeneração e (re)combinação. Num exercício metarreflexivo, processos de construção e de transmissão das narrativas populares de base oral são postos em evidência, sendo que, neste caso, não só a língua constitui um vetor para a lenda, como a lenda é o suporte e o mote para (des)codificar os mecanismos linguísticos e literários, os instrumentos que operam e procuram materializar a imaterialidade das estórias e dos seus contadores.
Em ambos os exemplos apresentados, Oráculo e projeto Murais e Literatura, os leitores são convidados a participar na recriação dos textos, demonstrando-se, de forma empírica, o papel vinculativo e performativo dos contadores na transmissão das narrativas populares. Estas são então entendidas e apreendidas como o resultado de um processo de coautoria, que, é, aliás, comumente aceite pela sabedoria popular e expressa na conhecida máxima: Quem conta um conto, acrescenta um ponto. No entanto, nas oralengas encontramos, para além de uma preocupação com a salvaguarda das lengalengas e cantigas infantis tradicionais portuguesas, a sua utilização como recurso para o ensino da língua e literatura portuguesas, na sua expressão escrita e oral. Nesse sentido, a utilização dos mecanismos combinatórios e gerativos cumpre uma função essencialmente pedagógica [23].
No caso de Oráculo, a sua eventual aplicação pedagógica é decorrente de um processo artístico de (des)construção da linguagem, tendo como pano de fundo a lenda da Bruxa d’Arruda. Este processo parte da natureza dos próprios processos combinatórios e gerativos, que estão na génese das narrativas populares. Assim, a natureza surreal e combinatória das lendas ou narrativas coaduna-se com as potencialidades surrealistas da ciberliteratura com base em processos combinatórios, acabando por sair reforçada. Numa tentativa de desmi(s)tificação da lenda da Bruxa d’Arruda, e tratando-se de um artefacto artístico que subverte uma ferramenta científica na sua matriz, Oráculo promove o efeito oposto: a sua (re)mitificação, a cada nova leitura. Em todo o caso, ambos os exemplos tiram partido da escrileitura, aproximando o leitor do papel do autor e promovendo abordagens participativas, a partir da (re)criação contínua da própria obra. Uma abordagem que, tendo como objeto as lendas ou narrativas populares, proporciona, em última instância, novas formas de (re)transmissão patrimonial.
IV. (Re)ler o Passado / (Re)escrever o futuro
Em O que nos dizem os mitos? – O caso de Torre de Dona Chama(Parafita, 2006), Alexandre Parafita distingue entre lenda e mito, com base em duas caraterísticas fundamentais; por um lado, a ligação da primeira a uma localização espaciotemporal e, por outro, a ausência de necessidade de ritualização para a sua transmissão. Assim, “a função social que cada relato desempenha e o valor pragmático que lhe é dado, tanto pelo narrador como pelo ouvinte” (68) serão fatores determinantes para a sua transmissão. É o relato que garante a transmissão e que confere o estatuto de lenda às narrativas de base oral.
No entanto, em Anacrusa, Ana Hatherly alerta-nos para diferenças substanciais na forma de receção dos sonhos (aplicáveis, julgamos, aos mitos e às lendas), pelos antigos e pelos contemporâneos, alegando que “enquanto hoje queremos explicar o sonho, os antigos quiseram interpretá-lo.” Deste modo, se no “primeiro caso, estamos perante uma atitude de des-mitificação; no segundo, estamos perante uma atitude de re-mitificação” (Hatherly, 1983: 6), constatação que segue na linha do que Hatherly havia já identificado em relação ao poema concreto que, na tentativa de desmitificação da arte, acabou por remitificá-la, aproximando “objecto funcional” de “objecto mágico” (Hatherly, 1975: 10-11).
Desta forma, reconhecendo-se a capacidade de (re)mitificação da literatura ou da linguagem, mesmo quando aparentemente reduzida à sua (i)materialidade, não deixam, porém, de se reconhecer, na mesma medida, as potenciais utilizações construtivistas e progressistas deste novo objeto mágico, que é a literatura digital.
O que poderá, aliás, distinguir a literatura digital de outras formas artísticas ou literárias é, por um lado, o facto de, como as precedentes vanguardas, a própria ter resultado de um processo de (re)criação e de valorização patrimonial: a da transformação do computador, no seu valor de uso, acrescentando-lhe uma função artística e literária. Por outro lado, será igualmente, com certeza, a sua capacidade metarreflexiva e as aplicações didáticas que proporciona, a partir da literacia processual, para a literacia linguística e, por fim, para a literacia artística.
O património imaterial, como é o caso das narrativas populares, possui uma capacidade inata de transformação e de mobilização, colocando em diálogo diferentes tempos, interlocutores, perspetivas de passado e de futuro, numa relação simbiótica e interdependente. O que a literatura digital acrescenta, enquanto ferramenta de educação patrimonial, é a possibilidade de encarar a (re)criação artística, não apenas como metodologia de estudo ou registo, mas sobretudo como agente de transmissão e de mudança; como oráculo para a (des)construção de velhas e novas narrativas e de tantos outros possíveis significados.
Numa conjuntura em que se discute, oficialmente, como referimos, a relevância do ensino da Literatura Digital em Portugal, será porventura útil contemplar as suas múltiplas dimensões e aplicações, incluindo a patrimonial, reconhecendo-se pelo menos duas abordagens possíveis, a partir dos exemplos apresentados, i.e.: 1) entender as obras de Literatura Digital como objeto de valorização patrimonial per se, no conjunto da tradição literária portuguesa; 2) entender a Literatura Digital como vetor para o património linguístico e literário português, na sua expressão escrita e oral. Por outro lado, reconhecendo-se o potencial e o interesse dos estudos artísticos como ferramenta para a transmissão do património, em particular do imaterial, os exemplos apresentados poderão ser aplicáveis para o desenvolvimento de abordagens bottom-up, que promovam, efetivamente, uma participação mais ativa das comunidades, não só na salvaguarda mas, primeiramente, na vivência do seu património. Nesse sentido, valorização e educação patrimonial são duas faces da mesma moeda, que necessitam, porém, de ser enquadradas numa estratégia de revitalização que se oponha à evidente tendência para a instrumentalização política e económica do património, especialmente do imaterial, anexa a fenómenos de folclorização turística (e identitária) [24]. Esta seria uma estratégia em que o património pode ser entendido como um recurso vivo, de e para os seus contadores, as comunidades, à luz da Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial.
REFERENCES
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NOTAS
[1] Pedro Barbosa (1950-) foi fundador e diretor do Centro de Texto Informático e Ciberliteratura (CETIC) na Universidade Fernando Pessoa, tendo sido pioneiro no domínio da investigação e da criação textual gerada em computador. É autor de várias obras e ensaios nas áreas da Literatura, Estudos Artísticos, Hipermédia e Teatro. Ver http://pedrobarbosa.net/ [17 Dezembro 2019].
[2] Discípulo de Abraham Moles, na École de Strasbourg, com quem desenvolveu trabalho de investigação no âmbito da arte gerada por computador, Pedro Barbosa terá tido por essa altura contacto mais profundo com a Estética Científica e o Racionalismo Existencial de Max Bense (com quem Moles trabalhou, em Estugarda).
[3] De referir, porém, os projetos e programas anteriormente promovidos pela organização, sobretudo vocacionados para a salvaguarda da Língua, como foi o caso do Livro Vermelho das Línguas em Desaparecimento (1993), ou com impacto direto sobre a salvaguarda das línguas e das tradições orais, especialmente o programa de Obras-Primas do Património Oral e Imaterial da Humanidade (1997-2005). Este último tendo resultado, aliás, na inventariação das primeiras noventa manifestações do Património Cultural Imaterial da Humanidade, posteriormente incluídas na lista representativa, criada em 2008, e da qual, a título de exemplo, faz parte a língua garífuna.
[4] Ver https://po-ex.net/noticias/conferencias-e-apresentacoes/coloquio-internacional-ensino-da-literatura-digital-25-e-26-07-2019-fluc-coimbra/ [17 Dezembro 2019].
[5] Apesar da formulação do termo surgir publicada apenas em 1996, a reflexão teórica em torno da Ciberliteratura decorre das experiências realizadas pelo autor no final da década de 1970. A este respeito, ver entrevista, ao autor, por Rui Torres, datada de Março de 2016 e disponível a partir da seguinte hiperligação: https://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/6014/1/ciber8_11.pdf [17 Dezembro 2019].
[6] Vd. https://po-ex.net/taxonomia/materialidades/digitais/pedro-barbosa-literatura-cibernetica-1-textos/ ehttps://po-ex.net/images/stories/pedrobarbosa/lc1/pb_lc1_configuracaodolaca_1977.pdf [17 Dezembro 2019].
[7] O algoritmo que permitia a geração de poemas foi elaborado em coautoria com Abílio Cavalheiro, e posteriormente disponibilizado no livro e disquete MS-DOS intitulado Teoria do Homem Sentado. Ver Barbosa, 1996.
[8] Ver https://po-ex.net/pedrobarbosa/PB_ELC3.html [17 Dezembro 2019].
[9] Salienta-se igualmente o seu contributo para o estudo, registo, edição e divulgação da poesia experimental portuguesa, através, entre outras in(ter)venções, da curadoria de exposições e, de forma muito particular, da dinamização do Arquivo Digital da Po.Ex – Poesia Experimental Portuguesa. A este respeito, ver https://telepoesis.net [17 Dezembro 2019].
[10] Obra acessível online, através da seguinte hiperligação: https://www.telepoesis.net/cantiga [17 Dezembro 2019].
[11] A este respeito, salientamos a experiência desenvolvida pela investigadora Ana Albuquerque e Aguilar com alunos do 10.º ano de escolaridade, a partir da obra Cantiga, cujos resultados foram apresentados no âmbito da ELO 2019, numa comunicação intitulada “Rui Torres’ Cantiga in Class – digital poetry in Portuguese schools”: https://cora.ucc.ie/bitstream/handle/10468/8128/ELO2019_programme.pdf [18 Maio 2020]. No mesmo contexto, fazemos ainda referência ao projeto Alice Inanimada, de cuja equipa faz parte a investigadora, e que consiste, em termos gerais, na primeira obra de Literatura Digital integrada no Plano Nacional de Leitura 2027. O projeto, para além de compreender a tradução dos primeiros 5 episódios da obra para Português, a partir do original – Inanimate Alice (https://inanimatealice.com/) – da autoria de Kate Pullinger e Chris Joseph, incluiu a preparação de recursos educativos e a dinamização de ações de formação específicas junto de professores do Ensino Básico e Secundário. Ver https://matlit.wordpress.com/2018/04/23/alice-inanimada-no-plano-nacional-de-leitura/ [18 Maio 2020].
[12] A título de exemplo, A experiência do prodígio: bases teóricas e antologia de textos-visuais portugueses dos séculos XVII e XVIII (1983) e Casa das Musas (1995) reúnem um extenso conjunto de ensaios da autora, dedicados ao estudo dos textos visuais portugueses do Barroco. A este respeito, ver https://po-ex.net/taxonomia/transtextualidades/metatextualidades-autografas/ana-hatherly-experimentalismo-barroco-e-neobarroco/ [17 Dezembro 2019].
[13] Em A Experiência do Prodígio: bases teóricas e antologia de textos-visuais portugueses dos séculos XVII e XVIII (1983), Ana Hatherly afirma o caráter educativo dos textos visuais do Barroco, pressupondo a participação do leitor no processo de codificação e descodificação do texto: “A atenção profunda, constante e até obsessiva que os autores barrocos dedicaram ao aspecto visual do texto é um exemplo decisivo do nexo que encontraram entre o aspecto gráfico-ideogramático da escrita e o fundamento filosófico da alegoria, pois em ambos o leitor é remetido para a "forma em si" como veículo significativo, como vaso que determina a forma do fluido que contém, que retém e a que se destina. Entre a intenção da imagem e a sua tensão significativa, a relação é a do nexo, a relação entre nexo e sentido.” (Hatherly, 1983: 72).
[14] Vale aqui referir, no contexto da literacia processual, o Curso Breve de Combinatória e Geração Textual organizado, em 2019, por Rui Torres e Bruno Ministro, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, a partir do software “Poemário”, com disponibilização posterior, na web, do tutorial do referido software, a partir da seguinte ligação: https://telepoesis.net/curso-breve/tutorial.html [17 Dezembro 2019].
[15] Ver http://pnl2027.gov.pt/np4/livrosdigitais.html [17 Dezembro 2019].
[16] Ainda a este respeito, entre os anos 90 do século XX e a segunda década deste novo milénio, houve lugar a toda uma série de inovações tecnológicas que têm vindo a modificar em larga escala os hábitos de consumo de leitura e não só. Não apenas na ubiquidade dos dispositivos móveis digitais, em que as sensações de intimidade e portabilidade são aspetos a ter em conta, mas também na tentativa de emular a perceção sensorial humana, sobretudo no reforço da componente tátil enquanto meio de interação privilegiado com a máquina. Ver, a este respeito, Marques, 2018. E, a propósito de Literatura Digital Infantil, ver Prieto, 2018.
[17] O projeto conta com a coordenação de Ana Maria Machado e a orientação de Rui Torres, assim como com a participação de quatro Doutorandos do programa de Doutoramento em Materialidades da Literatura e do Departamento de Engenharia Informática, da Universidade de Coimbra.
[18] Ver http://wreading-digits.com/bruxa/ [17 Dezembro 2019].
[19] wr3ad1ng d1g1t5 é um coletivo informal de artistas e investigadores portugueses, dedicado à criação artística, curadoria e investigação criativa. De entre as várias exposições e festivais de arte em que participaram contam-se: PLUNC 2015, ELO 2017, FOLIO 2017, FILE 2017, ARTeFACTo 2018. Ver http://wreading-digits.com [17 Dezembro 2019].
[20] A este respeito, ver http://www.cm-arruda.pt/premio-de-artes-bruxa-darruda [17 Dezembro 2019].
[21] A base de dados da obra foi constituída a partir de pesquisa online (esse vasto oráculo que é o motor de pesquisa Google) e da consulta de duas publicações dedicadas à figura e lenda da Bruxa d’Arruda: A terra da Bruxa (2017), da autoria de Casimiro Ramos e Guia Prático da Bruxa d’Arruda (2016), editado pelo Município de Arruda dos Vinhos.
[22] A exposição esteve patente entre 12 janeiro e 26 de março de 2019, no Centro Cultural do Morgado, em Arruda dos Vinhos. Ver https://www.jf-arruda.pt/viver-arruda/agenda/98 [17 Dezembro 2019].
[23] Ver a este respeito, E.M de Melo e Castro, A Dialéctica das Vanguardas (1976), na qual o autor e poeta experimental explora a ideia de tensão dialética entre discurso poético, de cariz entrópico, e discurso político, de carácter neguentrópico (Melo e Castro, 1976: 44-53), enquadrando-se a pedagogia e a didática neste último.
[24] A este respeito, ver o artigo de Paulo Peixoto, na Revista Crítica de Ciências Sociais de Coimbra, intitulado “Identidade como recurso metonímico dos processos de patrimonialização” (Peixoto, 2004).
© 2020 Diogo Marques e Ana Gago.
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