Desafios da Fraternidade
O pressuposto antropo-falogocêntrico em questão Repensando o humano e o humanismo com Lévinas e Derrida
DOI:
https://doi.org/10.14195/0872-0851_67_1Palabras clave:
fraternidade, fratricídio, feminino, feminicídio, ética, responsabilidade, diferença‑sexual, Lévinas, DerridaResumen
Cientes de que o maior desafio hoje em dia lançado à responsabilidade do pensamento (filosófico) é o de re-pensar os pressupostos da (carno-falo-logo-cêntrica) civilização ocidental, Desafios da fraternidade procura, num primeiro momento (cf. § 1 Desafios da fraternidade), salientar os riscos e os desafios do, no entanto, belo sonho da fraternidade: fá-lo salientando o seu pressuposto antropocêntrico-humanista ou, mais precisamente, antropo-falo-logo-cêntrico: um pressuposto firmado na (auto-)proclamação da soberania do humano-homem e, ipso facto, na oposição dual (e hierárquica) homem-mulher e homem-animal – oposição dual da qual emergem algumas das mais prementes inquietações que estão na ordem do dia: da dita igualdade de género às questões ambientais, das questões da vida animal às das tele-tecnologias e da mundialização.
Num segundo momento (cf. § 2 Os desafios da fraternidade ética de E. Lévinas), mostrar-se-á como, no decurso da sua longa história, cuja emergência e cujo perfil antropo-onto-teo-lógico muito sumariamente se tenta recordar (cf. § 1), a ideia de fraternidade pode não estar necessariamente ligada à fraternidade natural, biológica, literal, genética ou sexualmente determinada – para além do seu esquema dominante, e portanto já numa certa ruptura da tradição (mas ainda) na tradição patriarcal, a fraternidade também pode ter uma conotação espiritual, simbólica, universalista e confundir-se com a própria humanidade. Denotando «uma humanização do homem reflectida em fraternização», a história da fraternidade confunde-se assim com a história da própria humanidade – pelo que, meditar o sentido da fraternidade, é implicitamente meditar o sentido e a in-condição do humano. É, por exemplo, o que na contemporaneidade faz Emmanuel Lévinas (1906-1995) que, re-pensando embora meta-eticamente tanto a ética como a própria fraternidade – para além da estrita consanguinidade antropo-bio-lógica, portanto –, as pensa em termos de responsabilidade (meta-)ética e as toma por sinónimas de «humanidade».
Num derradeiro momento (cf. 3 A hipérbole feminista ou o feminino para além da diferença sexual e § 4 Femininizar a Fraternidade) mostrar-se-á como, operando embora uma significativa ruptura – uma ruptura ético-metafísica – com esta tradição da história da fraternidade, embora não sem ambiguidade, Levinas a reedita ainda: a reedita ainda no registo antropo-andro-cêntrico do seu humanismo do outro homem que, no entanto, paradoxalmente, a própria obra e o próprio pensamento do filósofo nos permitem também repensar e transcender através da sua hipérbole do feminino (Derrida). Uma hipérbole que, como tentamos mostrar, consubstancia uma espécie de «feminismo avant la lettre» para pensar um humano (sexuado) antes e para além do género e, portanto, antes e para além da própria diferença sexual (pensada em termos duais e, portanto, hierárquicos), assim combatendo tanto a neutralidade indiferente como o essencialismo da identidade una e o ideologismo de todo e qualquer «ismo»: trata-se de um feminismo sem idade, intempestivo, portador do sonho «da multiplicidade de vozes sexualmente marcadas» e tão libertador e emancipador da mulher quanto do homem.
É este pensamento e este combate que, em nosso entender, lavram a condição de possibilidade e a promessa de uma singular femininização da fraternidade falo-patriarcal de índole onto-bio-lógica e, por conseguinte, do humano, uma vez que, para Lévinas, a história da fraternidade se confunde com a da própria humanidade (ética) – uma humanidade incondicionalmente hospitaleira e em cuidado pelo outro.
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